O Desenvolvimento da Poesia Moderna em Macau

O célebre poeta de Macau Tao Li sublinhou no seu estudo sobre o desenvolvimento da poesia moderna em Macau que a poesia moderna só surgiu verdadeiramente na cidade na década de 1950, desenvolvendo-se na década de 1960 e atingindo o seu auge na década de 19801. O lançamento da Nova Plataforma e do Jornal AECM na década de 1950 proporcionou aos poetas locais uma oportunidade de divulgação das suas obras poéticas modernas, como meio de promover novos poetas em Macau. Nas décadas de 1960 e 1970, os poetas começaram a desenvolver os seus próprios estilos e características com base na sua experiência acumulada. A década de 1980 foi considerada uma época dourada para a poesia moderna em Macau em virtude da influência dos múltiplos poetas locais, bem como dos poetas que imigraram para Macau vindos do Interior da China e do Sudeste Asiático2. Estas diferentes origens culturais permitiram que os poetas se expressassem por meio de estilos poéticos diversos sobre temas como a situação nacional e social ou sentimentos pessoais, facilitando o desenvolvimento vigoroso da poesia moderna tradicional e da poesia moderna contemporânea.

 

Nota 1: Tao Li, Vestígios da Poesia Moderna em Macau, https://www.macaudata.com/macaubook/book030/html/00301.htm

Nota 2: Zhuang Wenyong, O Contexto Cultural do Nascimento da Poesia Moderna em Macau na Década de 1980, http://www.macaudata.com/macaubook/book054/html/00101.htm

O Período Áureo dos Círculos Poéticos

Wei Ming foi um dos poetas que marcou presença nos meios poéticos de Macau durante a década de 1980, tendo vivenciado o seu período áureo. “Os anos 80 foram de facto um período de florescimento para os círculos poéticos de Macau. Naquela altura, não havia apenas jovens poetas da minha geração, mas também poetas veteranos como Tao Li e Tao Kongliao, e ainda Wong Man Fai e Agnes Lam da nova geração. Foi um momento raro na história do desenvolvimento da poesia em Macau, em que poetas de diferentes gerações publicaram obras de diferentes estilos e temas durante o mesmo período.” Segundo Wei Ming, “a criação da secção “Kiang Hoi” do Jornal Ou Mun e, posteriormente, da secção “Juventude Chinesa” do Jornal Va Kio proporcionou duas novas plataformas que nos permitiram partilhar as nossas obras com um maior número de leitores”.

Um veterano dos meios poéticos locais, Wei Ming tem acompanhado de perto a sua evolução. “Na década de 1990, fiquei bastante impressionado com as obras de poetas como Wong Man Fai, Agnes Lam e Che Sio Peng; e, nos últimos anos, tenho também acompanhado o trabalho de vários jovens poetas, como Gaaya Cheng, Un Sio San, Jojo Wong e os poetas da Associação de Poetas de Macau Outro Ceu”. Segundo Wei Ming, “existem actualmente mais de 10 poetas, nascidos entre a década de 1970 e a década de 1990, a circular nos meios poéticos de Macau, contribuindo assim para a continuidade e evolução da cena poética local”. Wei Ming exorta também os jovens a serem mais experimentalistas e a visitarem as cidades da Grande Baía, próximas de Macau, de modo a conhecerem diferentes regiões e culturas e a criarem obras com uma atitude mais aberta e horizontes mais amplos.

Gaaya Cheng e Rui Mutsu: Companheiros Brincalhões

Uma pesquisa na Internet sobre Gaaya Cheng e Rui Mutsu leva-nos a um artigo sobre a entrevista que ambos deram a uma revista quando venceram o “4o Prémio Literário de Macau”. Ambos tinham uma aparência inocente de estudantes universitários, com os seus bonés levemente puxados para baixo sobre as sobrancelhas, os seus olhos revelando um traço de personalidade inflexível e as suas palavras sinalizando um desejo de criar poesia... Num piscar de olhos, passaram vinte anos e os dois desconhecidos tornaram-se amigos íntimos, experienciando juntos a transição da juventude para a paternidade. O amor é o tema mais comum dos seus poemas. Tendo permanecido fiéis ao forte carácter da sua juventude, ambos aprenderam com a vida mundana a serem sofisticados e terra-a-terra, evidenciando um sentido de humor capaz de conquistar o coração de muitos leitores.

Ambos nascidos em 1981, Cheng insiste jocosamente que é um “poeta da geração mais jovem” e que não é, de forma alguma, um homem de meia-idade. O seu amigo do peito, Mutsu, é um rapaz extrovertido com um variado leque de interesses, que vão desde a música à gastronomia e às sapatilhas. Desde os primeiros tempos em que se batiam em fóruns de poesia até começarem a colaborar na promoção das obras um do outro, não será exagero falar de uma relação de “amor-ódio” para descrever a natureza da sua amizade, apesar de oficialmente se dizer que ambos se apoiam mutuamente. Nos últimos anos, os dois poetas tentaram atrair a atenção do público para as suas obras através da produção de adaptações de Fuga e A Felicidade Ligou para os novos meios de comunicação social e da adopção de uma abordagem formal no lançamento dos seus livros no mercado, convidando modelos para tirar fotografias para os cartazes promocionais.

Com o doce fardo da família sobre os ombros, Cheng e Mutsu optaram por se tornar “semipoetas”, mantendo um emprego estável a tempo inteiro e envolvendo-se na edição de Pen of Macao nas horas vagas, conseguindo inclusive ter tempo para publicar as suas próprias obras. À questão sobre se hoje em dia se verifica alguma mudança notável nos círculos poéticos de Macau, uma vez que as plataformas das redes sociais se popularizaram, respondem os poetas que “na nossa opinião, não existe um problema de continuidade na evolução da poesia em Macau, como se constata pelo número estável de trabalhos recebidos para cada edição da revista. Muitos jovens têm enviado os seus trabalhos sobre vários temas, sugerindo que a cena poética local está ainda em florescimento”. Mutsu comenta com um sorriso que “os jovens podem promover as suas obras em mais canais do que antigamente, caso desejem começar a escrever poesia. Para além de publicar em revistas literárias, podem ainda publicar na Internet, sendo actualmente também mais fácil encontrar livros para aprender a escrever poesia com uma abordagem sistemática.” “Macau tem a sorte de possuir um solo fértil para os poetas. Os jovens não devem desperdiçar o seu talento, mas sim escrever com ousadia e sem medo”, acrescenta Cheng.

Pansy Lau: A Poesia é Uma Espécie de Fé e Eu Continuarei a Escrever

Pansy Lau, uma jovem poetisa “pós-1985” nascida e criada em Macau, começou a escrever poesia em 2007, tendo marcado uma forte presença nos círculos poéticos de Macau nos últimos anos. As suas obras podem ser encontradas sobretudo em jornais e plataformas literárias, tendo sido publicadas em duas antologias individuais: Margem para a Fragrância (2016) e Retrógrado (2019). Os seus poemas são geralmente inspirados nas suas reflexões sobre a vida quotidiana e nas suas observações sobre acontecimentos sociais e elaborados de forma articulada, podendo facilmente mexer com o leitor.

Sendo uma das principais figuras da nova geração de poetas de Macau, Lau observa que os círculos poéticos locais cresceram nos últimos anos, com a participação activa de vários jovens poetas. Cada poeta apresenta qualidades diferentes, seja nas suas obras ou antologias individuais, ou no mercado local ou taiwanês. “Talvez isso se possa atribuir às nossas ocupações. Para além de sermos poetas, também trabalhamos a tempo inteiro em diferentes áreas. Muitas vezes, integramos a nossa mentalidade profissional nas nossas obras e criamos assim novas imagens e novas formas de expressão. Mas é algo que acontece naturalmente, não é deliberado. Na minha opinião, esta pode ser considerada uma característica particular da poesia de Macau hoje em dia”, afirma Lau. Lau fica também satisfeita ao ver poemas das novas gerações pós-1990 e até mesmo pós-2000 em jornais locais e plataformas online, considerando positiva esta vontade de experimentar, embora as obras ainda se caracterizem por alguma imaturidade. “Para mim, a poesia é uma espécie de fé. Desde que acreditemos profundamente nela e continuemos a escrever e a aprender, não deixaremos de encontrar o nosso caminho e de melhorar a nossa escrita.”

Na opinião de Lau, ao contrário de há mais de uma década, altura em que entrou no universo da escrita de poesia, existem actualmente mais abordagens e mais espaço para o lançamento e divulgação de obras. “Antigamente, só podíamos publicar os nossos poemas em jornais e era bastante difícil receber feedback directamente dos leitores. Agora posso publicar os meus poemas nas minhas próprias páginas de redes sociais. Isso permite-me divulgar o meu trabalho de forma mais fácil e rápida e interagir mais directamente com os leitores, o que pode, por sua vez, tornar-se uma fonte de inspiração.” Lau já definiu um novo objectivo para si mesma: criar uma antologia contendo um longo poema de mais de 100 versos, o que constitui um novo desafio em termos de estrutura e expressão poética, incluindo a nível da imagética. “Penso que escrever poesia em Macau é, até certo ponto, um tipo de arte em risco de extinção. Tenho a sorte de ter obtido o reconhecimento dos leitores pelas minhas obras e, como poetisa, creio que me devia empenhar mais na transmissão desta arte às gerações mais jovens da cidade.”

Recomendações de Livros de Poesia

A partir das nossas coleção em formato impresso e electrónico, seleccionámos oito livros de poesia da autoria de poetas de Macau e de todo o mundo, propondo um olhar sobre a sua atitude perante a vida através dos seus belos e sucintos versos.

Clepsidra

▸ Clepsidra

Autor:Camilo Pessanha

Tradutor:Yao Feng, Jin Guoping

Editora:People’s Literature Publishing House

Data de Publicação:2016

(Coleção da Biblioteca Pública de Macau)

 

O poeta simbolista português Camilo Pessanha viveu em Macau durante 32 anos, onde concluiu a sua obra Clepsidra antes de falecer. A obra é uma antologia amplamente aclamada como sendo o epítome da poesia simbolista portuguesa. Centrado na ideia de uma ampulheta, o livro transmite a ideia de passagem do tempo e a sensação de impotência na vida, sendo o poema inicial uma inscrição tumular com apenas 28 palavras, as quais resumem brevemente a vida do poeta e expressam a sua solidão.

Segunda Pintura do Crepúsculo

▸ Segunda Pintura do Crepúsculo

Autor:Tao Kongliao

Editora:China Federation of Literary and Art Circles Publishing Corporation

Data de Publicação:1999

(Coleção da Biblioteca Pública de Macau)

 

Esta é mais uma antologia poética do autor de O Meu Crepúsculo e A Resposta do Crepúsculo. O crepúsculo não é necessariamente um motivo pessimista. O livro constitui um registo de cenas presenciadas pelo autor e dos sentimentos e pensamentos inspirados pelas mesmas, testemunhando o processo de adaptação e superação do poeta e dando expressão a um processo de auto-encorajamento.

The Matters Confirmed

▸ The Matters Confirmed

Autor:Ieng Ut

Editora:The Writers Publishing House

Data de Publicação:2015

(Coleção da Biblioteca Pública de Macau)

 

Ieng Ut é um poeta de Macau, nascido após a década de 1980, podendo as suas obras ser encontradas com frequência nas redes sociais. Este livro é uma antologia de 200 poemas da sua autoria, divididos em quatro secções: “Calão”, “Segurando Uma Caneta, Meu Amor”, “A Barreira Essencial” e “Os Assuntos Confirmados”. Graças à sua linguagem contemporânea e a um imaginário de grande requinte, Ieng tem vindo a revelar-se um dos poetas mais conhecidos entre as gerações mais jovens da cidade nos últimos anos.

C’est Moi

▸ C’est Moi

Autor:Tam Chon Ieng

Editora:Zebra Crossing Publishing

Data de Publicação:2016

(Coleção da Biblioteca Pública de Macau)

 

Este livro é uma antologia de 71 poemas da autoria de Tam, escritos entre 2002 e 2015, nos quais a poetisa retrata a sua experiência pessoal, bem como histórias de pessoas que a rodeiam, capturando pequenas cenas da vida quotidiana e fragmentos de pensamentos nos seus versos. Tam criou ainda um total de 21 ilustrações a estilógrafo para complementar os seus poemas, proporcionando assim uma experiência de leitura mais rica e completa.

Conexo e Desconexo: Antologia Poética de Yang Ke

▸ Conexo e Desconexo: Antologia Poética de Yang Ke

Autor:Yang Ke

Editora:Chinese Creation Publishing Co., Ltd.

Data de Publicação:2010

(Coleção da Biblioteca Pública de Macau)

 

Yang faz parte da terceira geração de poetas de talento, sendo um representante proeminente do movimento de “escrita popular” na China. Insistindo no princípio de que o acto de escrita deve ser dirigido ao espaço público, Yang inspira-se na vida quotidiana para escrever todos os seus poemas. Esta antologia de capa dura contém uma seleção de 100 poemas da sua autoria, divididos em três secções: “Clássicos”, “Novos Poemas” e “Obras-primas”, escritos no período entre a década de 1980 e os últimos anos, registando as suas observações da vida urbana.

As Rugas do Tempo

▸ As Rugas do Tempo

Autor:Adunis

Tradutor:Xue Qingguo

Editora:Oxford University Press

Data de Publicação:2012

(Coleção da Biblioteca Pública de Macau)

 

O poeta sírio Adunis é um poeta árabe de renome mundial. Sendo particularmente exímio na escrita de poemas de longa extensão e sendo autor de 22 livros de poesia e crítica literária, Adunis tem sido aclamado como um dos mais potenciais candidatos ao Prémio Nobel de Literatura nos últimos anos. Esta antologia contém os seus poemas curtos escritos entre 1958 e 2012, um período de cerca de 50 anos, permitindo ao leitor ficar a conhecer o seu estilo em diferentes fases do seu percurso criativo.

Mente Errante e Pensamentos Metafísicos

▸ Mente Errante e Pensamentos Metafísicos

Autor:Gao Xingjian

Editora:Linking Publishing

Data de Publicação:2012

(Coleção da Biblioteca Pública de Macau / Hyread ebook )

 

Gao foi coroado vencedor do Prémio Nobel de Literatura no ano 2000, sendo mais conhecido no mundo chinês pelos seus romances e peças do que pelos seus poemas. Este livro, com cerca de 20 poemas, é a primeira antologia poética do autor. Os seus poemas, escritos em linguagem coloquial e cativante, são facilmente compreensíveis, falando da vida com grande simplicidade e clareza, evocando imagens e ressoando na mente dos leitores.

Alguém Próximo Solta Uma Gargalhada

▸ Alguém Próximo Solta Uma Gargalhada

Autor:Huang Boxuan

Editora:Comma Books

Data de Publicação:2014

(Hyread ebook)

 

Poeta e vocalista de uma banda, Huang transmite os seus sentimentos por meio de uma combinação de poesia e música. Este livro de poesia divide-se em quatro secções: “Sensação de Frio”, “História Sem Ternura”, “Besta de Rubi” e “Em Direcção à Montanha”. Os seus poemas evidenciam um estilo e um tom versáteis, mas centrando-se sempre nos mesmos temas: a solidão, a confusão e os pensamentos peculiares da sua juventude.